Guiados pela vontade de
conhecer o SESC Bertioga, viajamos numa terça-feira rumo ao litoral sul.
O tempo começara bom,
iniciamos a viagem por volta das dez horas da manhã e o sol tentava mostrar o
seu rosto tímido no céu ainda meio cinzento. Numa parada no restaurante, já na
Via Dutra, uma rápida chuva nos livrou do perigo de estar na estrada.
A estrada estava tranqüila e
o conforto do GPS nos guiou com algum desacerto até os portões do nosso
destino.
Chegamos ao recanto de
lazer dos SESC por volta das quatorze
horas, e o cansaço da viagem não nos deixou observar a grandiosidade daquela
colônia. Toda recoberta por uma flora nativa, as praças insistiam em se cobrir
de folhas, dando aos jardineiros trabalho redobrado na coleta e na limpeza.
Com um pequeno “tour” depois
da portaria, seguimos direto par o restaurante, pois o avançar das horas nos
trazia certo vazio e uma vontade imensa
de alimentação.
Conhecer o apartamento foi a
penúltima atividade da tarde, pois logo descobrimos uma lista de atividades diárias,
oferecidas pelo complexo, que atendiam a todas as idades e gostos, começando pelas brincadeiras infantis passando
por atividades esportivas e físicas terminando
com trilhas e passeios em pontos ecológicos e históricos da cidade.
Um rápido passeio na praia
nos presenteou com os últimos raios de sol e o seu poente mostrou-nos as
belezas das paisagens que circundam a região montanhosa desta cidade.
Um passeio descrito como trilha das águas estava previsto para
quarta-feira (no dia seguinte) a partir
das oito horas da manhã, onde a proposta era de conhecer o ponto de captação de
água que abastece toda a estrutura SESC Bertioga. Inscrevemos-nos.
Ainda tínhamos a noite: conhecemos as lojas, salão de jogos de mesa,
informática e auditório e fomos dormir ansiosos para o grande passeio da manhã
do dia seguinte.
Amanheceu com um dia meio chuvoso, o céu cinzento insistia em
nos fazer desistir do passeio. O café da manhã nos fez criar mais energia e
decidimos que nada nos faria desistir do nosso intento.
Carregando na mochila água, capa de chuva, boné máquina
fotográfica, filmadora e uma fruta, enfrentamos o chuvisqueiro para alcançar a marquise do restaurante onde o ônibus já
estava a postos.
O trajeto do ônibus até o Rio
itapanhaú
(pedra preta mole) por onde fizemos a
travessia, foi rápida e tranqüila. O tempo parecia que ia dar uma trégua, mas os
mosquitos insistiam em perturbar o sossego dos trilheiros. Uma boa borrifada de
repelente amenizou os males e seguimos em frente.
O clima era de muita
expectativa e alegria. Apesar do tempo chuvoso, todos estavam dispostos e com
muitas questões sobre todo aquele ambiente novo onde éramos colocados a
caminhar.
A equipe do SESC que nos
guiava era formada por um Engenheiro Florestal Sr. Juarez, técnica ambiental
Sra. Luciana e um grande conhecedor da
região chamado Roberto, mais conhecido como “Queijão” que diz a lenda que
quando pequeno era conhecido como “Polenguinho”.
A marca registrada do Mangue
é a presença da vegetação diferenciada com raízes submersas e a fauna onde
predomina diversas espécies de caranguejo. O mangue era quem dá nome ao Rio,
pois o barro preto que prevalece como suporte às plantas e aos animais, era
chamado pelos índios tupis como “pedra preta
mole”, isto é itapanhaú.
Transpassado o mangue, e mata
de restinga, chegamos a outro tipo de vegetação, mais densa com a predominância de árvores mais altas e
palmeiras, que conforme os nossos
especialistas e guias, era a famosa mata atlântica.
A riqueza da flora destas matas
nos deixou boquiabertos. Ao longo da trilha podemos observar inúmeros tipos de
avencas, samambaias e bromélias. Muitas
espécies de palmeiras e a típica “banana de macaco” que alem de alimento pode
ser usada como planta medicinal.
A beleza da cobertura do solo
esconde pequenos insetos e muitas espécies de repteis e anfíbios, que no nosso
cotidiano nem pensamos em encontrar. Um olhar atento e observador pode-se
descobrir coisas fantásticas.
A terra úmida pelas gotículas da chuva liberava em nós um cheiro
gostoso da relva, que transcendia o nosso olfato para criar em nossas mentes um
gostoso retorno à infância, trazendo de volta lembranças das brincadeiras nas
corredeiras barreadas das chuvas nas encostas de terra vermelha recém-lavrada
para plantação.
- Roberto, tem um sapinho
estranho aqui!
- É uma perereca. É da família das Polypedatidae, mais
conhecida como mini-perereca – disse o Roberto. - Tem muitas espécies delas
nesta mata. Existem outras espécies como a Phylomedusa que são muito estudadas
no Brasil pelas cores nacionais. São as pererecas verde-amarelas, tão pequenas
como o dedo da nossa mão.
Seguindo
a trilha das águas, as estórias foram sendo contadas. O Engenheiro Florestal Sr. Juarez, falou
sobre a influência do SESC Bertioga na
vida dos moradores desta cidade. A preocupação incessante em relação ao meio ambiente, o SESC foi buscar na
montanha a captação da água para abastecer colônia e promover consorcio com a Prefeitura no controle do meio ambiente.
O
tratamento do esgoto também é uma prioridade do SESC Bertioga, que devolve ao rio
a água com 90 % de pureza, com recursos próprios.
O
final da trilha é o ponto de captação de água. Como um oásis que de repente
surge no deserto, no alto da montanha surgiu uma casinha feita em alvenaria com
uma pequena infraestrutura para abrigar um segurança e equipes de manutenção
que permanece vigiada 24 horas por dia. Água
pura para os cantis, banheiro para as necessidades básicas e até um cafezinho
feito no fogão de lenha com gosto e cheiro de casa de caboclo.
Incrustada
ao pé de uma pequena cachoeira, a captação de água é feita por duas tubulações:
uma antiga e outra mais recente por onde a água é captada pura no alto da montanha, fresquinha e transparente como na bica na nascente.
Na
volta, descendo trilha abaixo, fomos
premiados com um banho de cachoeira de vinte minutos que valeu como um
exorcismo da poluição que contaminava o nosso corpo. Voltamos tranqüilos para a sede da colônia do SESC, mais puros e mais conscientes sobre o mundo em
que vivemos e sobre a preservação do meio ambiente.
No
SESC, as histórias de Bertioga, são contadas através dos passeios como o que
aconteceu no dia seguinte quando participamos da trilha do Rio Jaguareguava (Onde
a onça bebe água), um dos afluentes do Rio Itapanhaú.
Neste
dia o tempo colaborou um pouco deixando o céu mais aberto e com poucas nuvens.
O translado com ônibus demorou um pouco mais e a trilha, bem mais curta, seguiu
direto floresta de encosta da serra do mar pela mata atlântica. Aos poucos nos embrenhando pela mata e
ouvindo histórias e lendas contadas pelo Guia e ex palmiteiro Genivaldo, que entre outras nos contou sobre o tempo em que participava efetivamente
das coletas ilegais do palmito Jussara que antes eram exploradas por
“palmiteiros” profissionais, hoje pela lei é preservada e faz a beleza no
interior da mata.
No final da trilha existe um amontoado de tijolos com estrutura em concreto,
bem às margens do Rio Jaguareguava. Segundo o nosso Guia Genivaldo, neste lugar
funcionava um ”porto de areia” onde os empresários invadiam a mata preservada e
sugava do leito do Rio areias de construção, interferindo no seu curso, na vida
aquática e na mata ciliar protetora das margens e na vida da cidade. Com a
aplicação da Lei e a fiscalização dos órgãos competentes os empresários foram
expulsos e a natureza seguiu seu curso.
Neste
passeio tivemos a oportunidade de conhecer com mais intensidade a exuberância
da flora local e influencia do SESC no crescimento do turismo local e na vida dos caiçaras, que encontrou nesta
instituição novas oportunidades de trabalho e de vida.
Entre
as histórias de Bertioga está inserida também a História do desenvolvimento e da
interiorização do Brasil que envolve os
índios Tupinambás, os navegadores portugueses e o Padre Anchieta.
Foi
num passeio histórico liderado pelo pesquisador Carlos Eduardo de Castro, o
Cadú, que viajamos pelos caminhos do Forte de São João onde nos anos de 1531, travaram-se grandes
lutas entre os Tupiniquins e os Tupinambás ( índios antropófagos) que eram
aliados dos franceses na ocupação do litoral brasileiro. Entre uma história e
um poema, a nossa imaginação voava séculos
no tempo e a descoberta pela verdadeira história do Brasil nos envolvia com lendas
pitorescas com nomes como Hans Staden,
um alemão aventureiro que ajudou na defesa no nosso território dos franceses e
que foi comido pelos índios.
A
nossa imaginação viajava ainda pelos arcos e flechas e das grandes invasões europeias, quando o nosso Cadú navegou pelos Porões das embarcações escravagistas e trouxe à tona o tempo do comércio de
escravos e fechou com a beleza do poema de Castro Alves: “O Navio Negreiro”,
ambiente nacional que deu sequencia ao ciclo econômico do Brasil da Cana de
Açúcar.
Voltamos
para a Colônia com uma visão diferente da nossa história e com um desejo enorme
de aproveitar também os dias de calor que o astro rei nos proporcionou nos
últimos dias de nossa estada, que nos glorificou com a saúde do corpo,
purificação da alma e engrandecimento da
mente.
Paulo
Freitas
Janeiro
/ 2012