São oito horas da noite de um domingo. Uma garota despede-se de suas amigas e se afasta da lanchonete em direção a sua casa. Gostaria de ter ficado mais com as amigas, mas os compromissos na segunda-feira lhe impedem abusar do horário. Perdida em seus pensamentos, lembra que no dia seguinte terá uma entrevista de trabalho. Apesar dos seus dezesseis anos e muita responsabilidade. O seu único defeito é gostar de se divertir, de tomar cerveja e conversar com as amigas. De longe alguém a observa. Dois homens que acompanharam sua saída da lanchonete, a seguem rua abaixo. Um deles se adianta e a ultrapassa, ela se assusta quando ele passa, pois a encarou com um olhar medonho.
Depois de dez minutos de caminhada, a um quarteirão de sua casa, ao passar por um terreno ermo, o homem que a ultrapassou há pouco, sai da penumbra da noite e a interpela impedindo-a de continuar o seu trajeto. Ela tenta se safar, mas o segundo homem chega e a agride, impedindo-a de gritar apontando uma faca em sua direção.
Com palavras de ordem e muita agressividade, os homens a arrastam pelo terreno baldio e neutralizam os seus movimentos, abusando do seu corpo sexualmente, um de cada vez até satisfazerem totalmente seus instintos animalescos. Fugiram depois abandonando-a desacordada com as vestes rasgadas e muitos ferimentos pelo corpo.
Não tiraram a sua vida, mas tiraram de sua vida todos os sonhos de juventude. Ficaram marcadas para sempre em sua mente aquelas agressões como sequencia de traumas emocionais que afetaram seu comportamento físico e o psicológico.
As marcas da brutalidade ficaram em seu rosto em forma de cicatrizes. Marcas mais profundas ficaram em seu coração e na sua mente. Os seus sonhos se tornaram doentes e inseguros. Os medos cavaram abismos nos caminhos de sua vida.
Aqueles homens, ou talvez animais travestidos de homens, certamente continuarão por aí a fazer vitimas. Eles, na sua concepção de vida, certamente não encontram outras maneiras de mostrar suas libidos. As suas mentes criminosas se formaram em ambientes propícios para a discórdia onde o amor é apenas uma falsidade para enganar suas tendências instintivas. As pessoas, para eles, são como coisas ou objetos que servem para serem usadas, consumidas e descartadas como lixo ou restos de alimento.
Aqueles homens, frutos de uma sociedade decadente, sem valores, sem critérios e sem limites, fundamentam suas vidas no prazer do agora. Cultivam vícios e modelos que determinam o espelho para os seus descendentes, construindo um buraco negro na sociedade onde o medo e o crime imperam como únicos caminhos a seguir.
Aquela jovem, criança nos desejos, adolescente nos sonhos e adulta nas responsabilidades, era talvez a esperança de um modo de vida de salvação dessa sociedade onde a família está em ruína. Ela seria talvez o fio da meada em busca da solução para violência em que o jovem caminha cada vez mais para o fim do poço em busca de drogas cada vez mais baratas e cada vez mais mortais. Esta droga que detona as mentes infecciona os relacionamentos e mata precocemente a motivação da vida.
A família, a maior prejudicada em todo processo, sofre a perda de um ente querido e cobra ação da justiça que acumula processos e presos em CDPs a espera de soluções. Esta justiça, sem meios, e sem critérios que só é justa para vitimas com bons advogados. E libertadora para criminosos com grandes contas bancárias.
Enquanto isso a impunidade impera nas comunidades, nas classes medias e nas classes dominantes. O grande poder de dominação dos criminosos e contraventores faz proliferar e multiplicar de forma geométrica os vetores do crime. Os governantes que têm nas mãos o poder da mudança fabricam leis que facilitam o crime, criam jurisprudências que libertam criminosos e legislam em causa própria para desviarem verbas que poderiam mudar um pouco o panorama e o futuro desta sociedade.
Que Deus, a única esperança dos bem- intencionados, possa ouvir os clamores dos crentes e dos fiéis, e implante um pouco mais de sentimentos bons nos corações dos homens para que estes passem a enxergar o outro como irmão e não como mero coadjuvante de uma história.
Paulo Freitas
Set/2011